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Da linha férrea aos tempos atuais: veja como era e como ficou a Estação Leopoldina

Em meio a embarques e desembarques, o movimento dos viajantes dava forma ao maior ponto de referência do município: a Estação Leopoldina

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Assim como não se entra duas vezes em um mesmo rio, quem transita pelas ruas de uma cidade integra um cenário que muda a todo o momento. Em Petrópolis, por muitos anos a Rua Doutor Porciúncula, sede da antiga estação ferroviária, foi símbolo do ritmo acelerado que começava a fazer parte do cotidiano urbano. Em meio a embarques e desembarques, o movimento dos viajantes dava forma ao maior ponto de referência do município.

Fotos: Museu Imperial/Ibram/MinC – Bruno Avellar

O ano era 1854 e se inaugurava a Estrada de Ferro de Petrópolis, primeira linha-férrea do Brasil. A iniciativa, que partiu do empresário brasileiro Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de Mauá, tinha como trajeto inicial a ligação entre a antiga Estação Mauá, em Magé, até Fragoso. Foi apenas em 1883 que a locomotiva chegou pela primeira vez a Petrópolis, na Rua Visconde de Souza Franco.

Como aponta o professor Oazinguito Ferreira, um dos resquícios desse período vivido pela cidade é a origem do nome ‘Morro da Oficina’, localizado no Alto da Serra. ‘Antes da Estação Leopoldina se instalar definitivamente no Centro, naquela região onde vemos o BNH do Alto da Serra e o Colégio Rui Barbosa eram feitas as manobras dos vagões, retornos e abastecimentos; era onde a oficina estava situada. Daí o nome’.

Ainda segundo o professor, as principais linhas feitas pelo trem seguiam de Petrópolis até Areal, com subestações em Cascatinha, Nogueira, Pedro do Rio e São José, por exemplo. O movimento de passageiros crescia cada vez mais, o que criou condições favoráveis para o surgimento de empreendimentos na chamada ‘Rua da Estação’, atual Rua Doutor Porciúncula em homenagem ao político que lá morou em um chalé.

Fotos: Museu Imperial/Ibram/MinC – Bruno Avellar

Hotéis e casas comerciais ocupavam toda a extensão da via que compunha a primeira visão dos viajantes que chegavam de viagem. Fruto disso é a Confeitaria Comércio e seu inconfundível relógio: reflexo da vida moderna que já implicava em uma preocupação crescente com o tempo. João Batista Silva, 55, trabalha há 41 anos no estabelecimento e comenta a posição estratégica do instrumento. ‘O relógio fica logo acima da Confeitaria então do outro lado da rua as pessoas o avistam assim que saem do Terminal’.

Ele, que começou a trabalhar na padaria aos 14 anos, já se aposentou e conta que não pretende deixar o local tão cedo.

‘Me chamam de Joãozinho. Acredito que tenha sido porque entrei aqui muito novo. O apelido pegou e agora não só os próprios funcionários e fregueses me chamam assim, como até em casa. Realmente gosto do que faço e continuo de coração. Apesar do ritmo de vida hoje ser corrido, há sempre um carinho nas relações com os fregueses’, diz João.

Na mesma rua, outra pessoa que compartilha esse sentimento de apreço por um dos pontos mais tradicionais da cidade é o senhor Lino Ângelo, proprietário da Relojoaria Ângelo e que aos 12 anos já auxiliava seu pai na loja. A paixão pelo ramo foi herdada por sua filha Vera, terceira geração no negócio.

Lino é quem garante que as engrenagens estejam sempre em movimento seja no Museu Imperial, no Convento da Virgem, na Igreja do Sagrado ou no próprio Relógio das Flores, por exemplo. Ele também participou da revitalização do relógio da Confeitaria Comércio em 1985.

‘O relógio foi inaugurado em 1922 pela Relojoaria Suíça do senhor Otto Iwerk, que funcionou de 1911 até 1956. No interior da padaria existe um outro relógio que controla o de fora. Sem ele o maior não existe. A cada 60 segundos é enviado um impulso de eletroímã pro de cima. Ele fecha e, quando abre, deixa escapar o ponteiro de um minuto’, explica.

Ao longo dos anos a estação foi ampliada e sofreu modificações, sendo uma das mais marcantes a ocorrida durante o Estado Novo de Getúlio Vargas. ‘Ocorriam críticas à nova arquitetura do que consideravam ser uma cópia da Central do Brasil e do estilo nazista. Seu relógio não vingou no seio da sociedade porque a população se guiava pelo tradicional relógio do Hotel Comércio’, diz o pesquisador de História Oazinguito.

Fotos: Museu Imperial/Ibram/MinC – Bruno Avellar

A linha férrea foi desativada pelo Governo Federal em 1964 e, de acordo com o mestre, ‘a principal vítima da medida foi a população carente que possuía um transporte barato’. Hoje, o Terminal Rodoviário Imperatriz Leopoldina é constantemente alvo de críticas por conta das condições precárias de sua estrutura. Nos corações dos petropolitanos restam apenas as lembranças e saudade de um tempo de glória e requinte.

(Matéria publicada no Jornal Tribuna de Petrópolis em 29/04/2018)

Carolina Freitas

Jornalista e escritora, Carolina Freitas se dedica ao resgate e à valorização da memória petropolitana a partir da produção de reportagens e curtas-metragens sobre a história, o comércio, e a vida da cidade.

4 Comments

  1. Muito bom! Me deu saudade de caminhar por aquelas ruas. Parar para um café na Comércio e comer uma empada na antiga e extinta Casa Itararé!

  2. A recuperação do Relógio da Estação se deve ao Dr. Arhur Leonardo de Sá Earp, um apaixonado pela Cidade e que fez de tudo para colocar o relógio em funcionamento novamente, depois de muitos anos parado. Obrigado por esse lindo trabalho, Dr. Arthur.

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