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Cantina Umberto: amor e sabor entre camadas

Italianos, os Falconi sabiam como impressionar na cozinha

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Independente do ambiente, o papel da cantina era eminente. Na massa ou na parede, na cozinha ou fora dela, deixar sua marca era substancial. Decorrente de ingredientes calculados e precisos, a Cantina Umberto foi um marco: projetou perspectivas, possibilidades e promessas.

Mesmo quando as lembranças da Cantina Umberto parecem nubladas, são os sabores guardados por quem criou gosto pelo estabelecimento que são evocados. Uma vez fora, difícil não se sentir tentado a preparar uma massa que, ao menos de longe, lembre a da família Falconi. Para a cozinheira Sonia Maria Gomes de Carvalho, se não for a original, nem adianta!

“Era uma massa maravilhosa. Me lembro das pizzas fantásticas que meu pai comprava lá. A mais tradicional era a de mussarela com presunto. Me deu até água na boca! Comprávamos para levar para casa porque não tinha delivery. Já vinha prontinha. Me lembro que meu pai parava com o carro ao lado do rio e pedia para eu ir lá pegar. Era muito legal”.

Sonia, que depois de se aposentar decidiu investir em suas aventuras ao fogão, explica que apesar de não servir massas, preserva em seu próprio negócio um ponto-chave da Cantina: a tradição. “Faço tudo no fogão à lenha. Tem alguma característica do tempo de avó, daquelas receitas antigas. Antigamente víamos os pais cozinhando, os avós”.

Companheiros leais, os netinhos estavam em todas. O psicólogo e comerciante Luiz Antônio Mamede, de 60 anos, conta que, na companhia dos avós, saía do Umberto fascinado. “Minha lembrança é fragmentada porque a cantina é de uma geração anterior à minha, mas me lembro das pilhas de queijo parmesão. Eram peças de seis, dez quilos empilhadas até quase o teto”.

Satisfação entre garfadas

Fotos: Reprodução Internet – Bruno Avellar

“O Umberto significava sair da rotina, comer algo saboroso que eu escolheria e não que seria obrigada a comer”. Para a engenheira Maria Aparecida Lopes, de 66 anos, se perder entre o molho e queijo da Cantina era um gesto de liberdade. Simples, mas marcante. Corriqueiro, mas altamente aguardado.

“Me lembro da pizza e das massas até hoje! O sabor, a medida certa dos ingredientes, o tomate. Aquilo era uma delícia. Minha mãe sempre comprava para o almoço e lanche de sábado. Tinha aquela comida do dia a dia com legumes que eu nem sempre gostava e, aos sábados e domingos, a comida era mais do jeito da gente”.

Para os proprietários do estabelecimento, a recepção positiva do público às receitas que ajudavam a contar suas origens e cultura era dignificante. O aposentado Renato Falconi, de 85 anos, sobrinho de Umberto, relembra a trajetória da Cantina e os fatores que fizeram dela ser bem aceita.

“Na Itália, meu bisavô Antônio era chefe da estação de trem. Acontece que ele veio para o Brasil quando a Itália entrou na guerra contra a Abissínia, na Etiópia, com medo de ser chamado. Por serem italianos, os Falconi sabiam o que fazer na cozinha. De geração em geração, davam continuidade na maneira de fazer, na mesma qualidade e dedicação”.

E assim foi. Em 1908, o avô de Renato, Rômulo Falconi, fundou o restaurante que fez história na cidade. Quando fechou, foi a vez da Cantina brilhar. “O Umberto e meu pai ficaram com o restaurante até 1956. E foi aí que meu tio saiu e montou a Cantina Umberto, que deu segmento ao que era o Falconi. Por fim, abri o Restaurante Domenico, que é o nome do meu tataravô”.

Ponto de encontro e degustação, a Cantina Humberto foi um marco. Ao mesmo tempo em que os fregueses saíam de lá com a sensação de terem adquirido bagagem, se sentiam na obrigação de deixar sua marca e um pedacinho de si lá dentro. “Tinha uma parede autografada e, na outra parede, eram quadros que ele e os amigos pintavam, expunham e vendiam”.

Cuidadosamente tratadas, as assinaturas tornavam a cantina um livro do qual todos se sentiam parte, convidados a escreverem suas próprias palavras. O aposentado Paulo Falconi, de 73 anos, resgata alguns dos nomes que passaram por lá: “Ia muita gente conhecida da época, de artista: Jô Soares, Dircinha Batista e a irmã dela”.

Com uma equipe de mão cheia, o difícil era a saída não exceder as expectativas. Paulo diz que seu pai, Umberto, fez questão de resgatar ex-funcionários do Restaurante Falconi para integrar o empreendimento. “Os garçons e cozinheiros, foram todos para a Cantina. Meu pai os arrebanhou na cidade”.

Umberto e Antônio Falconi, respectivamente, na companhia de um bom prato de massa e algumas garrafas de vinho, seis, mais precisamente. (Foto: arquivo pessoal Maylin Falconi)

Um recheio de lembranças

Além da tradicional pizza, quem garantia a casa cheia era a generosa lasanha. Renato, tio de Paulo, dá o “pulo do gato” do prato.

“Fazíamos travessas de lasanha, que media uns dez centímetros de altura. Nos fins de semana eram 15 travessas, com 20 pedaços cada. O segredo era não colocar direto no forno, mas colocar na geladeira de um dia para o outro porque ela tira a umidade em excesso do alimento”.

Para Renato, a generosidade sempre fez parte da rotina do negócio. Para o exemplificar, ele menciona o dia da inauguração da cantina: “Teve pizza de graça para todo mundo. Quando que um restaurante hoje vai fazer isso? Ele já abre a casa devendo, quanto mais faturar a ponto de poder dar!”.

Nos recheios ou no atendimento, Umberto estabelecia padrões que impressionavam. Onofre de Assis, de 87 anos, se orgulha em dizer que trabalhou para a cantina enquanto garçom na década de 60. A idade pode ter levado algumas de suas lembranças, mas não o carinho nutrido pelo ambiente: “Trabalhei com o meu irmão, Nelson de Assis. Eles gostavam de mim e eu deles”.

Inabalável ao tempo, a Cantina Umberto ditou promessas de quem jurou não se esquecer de emoções vividas entre garfadas e camadas.

(Matéria publicada no jornal Tribuna de Petrópolis em 27/01/2019)

Carolina Freitas

Jornalista e escritora, Carolina Freitas se dedica ao resgate e à valorização da memória petropolitana a partir da produção de reportagens e curtas-metragens sobre a história, o comércio, e a vida da cidade.

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