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Relojoaria Brilhante e a joia do tempo

‘Vai lá no Gil porque ele resolve as coisas!’. Era assim que a expertise do gerente era descrita pelos clientes

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Sem atrasar ou adiantar o relógio, a casa, simplesmente, regulava os ponteiros e indicava a hora de fazer da existência, experiência. Preciso, o serviço tornava o retorno do cliente decisivo. Tradicional e digital, era no dar corda ou no trocar de pilha que estava a manutenção da maior joia que a Relojoaria Brilhante poderia abrigar e fazer funcionar: o tempo.

Valioso, tal qual um adorno, é a partir do momento em que se enxerga o tempo como uma herança a ser zelada que se passa a celebrá-lo. E era esse o caso de Péricles Nunes, pai da aposentada Regina Marias Nunes Thess, de 71 anos. A cada netinho que nascia, um presentinho ele escolhia em retribuição às graças concedidas.

“Toda vez que nascia um neto lá em casa ele presenteava com um cordãozinho de lá, uma medalha, um crucifixo, ou uma figuinha de ouro. E na minha formatura ele me deu uma pulseirinha de ouro. Tudo comprado na Brilhante. Ele tinha muito carinho por aquela relojoaria. Parecia ser a única na cidade para ele. Lembro que ele gostava muito do gerente Gildo, que ele chamava de Gil”.

‘Vai lá no Gil porque ele resolve as coisas’. Era assim que o senhor Péricles resumia a expertise do gerente Gildo: garantia de auxílio fosse no que fazer para consertar ou do que comprar para presentear. O representante comercial Carlos Alberto Lira Forster, de 59 anos, relembra a passagem do pai pela loja e os cinco anos em que trabalhou junto dele.

“Meu pai tinha 18 anos quando começou a trabalhar na Brilhante, onde ficou a vida toda, mesmo depois de aposentado. Ele era muito requisitado no ofício: ímpar no atendimento, na honestidade, na seriedade. Meu pai, para mim, foi um exemplo de pessoa que soube cativar, não só pela questão da venda, mas também pelo se relacionar com as pessoas, que até hoje falam dele com carinho”. 

Capaz de atender, vender e, ao mesmo tempo, aconselhar, pode-se dizer que a presença do senhor Gildo na loja era um dos motivos que tornavam as compras satisfatórias. “Comecei na Brilhante aos 14 ou 15 anos fazendo serviços gerais e, numa dessas, tive a oportunidade de atender. Começar a trabalhar junto do meu pai me fez querer seguir os mesmos passos, o mesmo caminho”.

E pode ser que tenha sido o ‘Gil’ o responsável por, assim como acontecia com o senhor Péricles, nortear a compra de Alciana Maria Mattos de Andrade Guerra, de 65 anos. Depois de vasculhar ao menos três relojoarias da cidade em busca de sua aliança de casamento, ela explica que foi na Brilhante que encontrou a união de bom preço, bom gosto e bom atendimento com que sonhara.

“Foi um momento único que nunca esqueci. A alegria de ter achado a aliança misturado à emoção do casamento. E nunca esqueci da aparência desse senhor que nos atendeu, muito tranquilo. Acho que esses 38 anos de casamento começaram encontrando as alianças certas, que entraram com facilidade e não precisaram de nenhum ajuste”.

Fotos: Reprodução Internet – Alexandre Carius

Alianças que valem ouro

Voltando à ideia do tempo como indicador de uma herança que agrega valor, à medida em que os funcionários acumulavam tempo de casa, mais se sentiam responsáveis pela engrenagem que mantinha a precisão do atendimento da Relojoaria Brilhante. Para o advogado Celso Luis Neiva, de 56 anos, contudo, o pouco tempo em que colaborou com a loja foi o suficiente para, por ela, nutrir respeito.

“O que eu levo é o respeito que tinham com o consumidor, o senso de família e a capacidade humana de entenderem as aspirações dos funcionários. Na época quem me convidou a trabalhar lá foi o senhor Raul. O gerente era o senhor Gildo, pessoa muito boa e parente dos antigos donos, alemães. Já o relojoeiro era o senhor Otto Klippel, que entendia do ofício como ninguém”.

Tendo trabalhado como vendedor por cerca de um ano até 1980, quando se mudou para Belo Horizonte, Celso ressalta a visão da relojoaria em formar técnicos. Afinal, foram três gerações da família Klippel envolvidas no empreendimento, como aponta o neto do fundador, o aposentado Nilson Kilppel, de 69 anos, até que o negócio fosse assumido pelos senhores Raul, Alberto e Adelino.

“Quem fundou a relojoaria foi meu avô, J. James Klippel. A partir dele aprenderam o ofício meu pai, Nelson João Guilherme Klippel, eu e meu irmão, Nelson. Sendo que meu avô aprendeu a profissão na própria família, com os pais, então a relojoaria foi referência por muito tempo. Desde nossa época de garoto tinha gente que saía de casa aos sábados para parar na relojoaria e, às vezes, só conversar”.

Ainda que o ambiente fosse propício a uma boa conversa, o que da relojoaria saía dispensava palavras. A petropolitana Vera da Cruz Silva, de 62 anos, se emociona ao lembrar das aquisições feitas pelo falecido marido, Erivaldo Antônio da Silva, na loja. De uma medalhinha de ouro a alianças, as lembranças são preciosas.

“Quando ficamos noivos, em 1977, ele comprou nosso par de alianças na Brilhante e, dali para frente, sempre comprava lá. Quando meu filho nasceu foi um cordão com uma medalhinha de anjo de guarda. Agora, bonito mesmo foi na boda de prata dos meus pais. Ele mandou celebrar uma missa lá na Igreja de São Sebastião e, na hora, os presenteou com o par de alianças. Eles nem esperavam”. 

Abrigo de instrumentos pautados por momentos, era no apreciar e no fazer funcionar o tempo que a Relojoaria Brilhante tinha sua principal riqueza.

(Matéria publicada no jornal Tribuna de Petrópolis em 08/09/2019)

Carolina Freitas

Jornalista e escritora, Carolina Freitas se dedica ao resgate e à valorização da memória petropolitana a partir da produção de reportagens e curtas-metragens sobre a história, o comércio, e a vida da cidade.

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