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Florilandia: paraíso petropolitano

Chegando a 12 mil roseiras, de 72 espécies, Petrópolis colecionava pedacinhos da Holanda, Inglaterra, França, Irlanda e Itália

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Num horizonte de sonhos cultivados, as alamedas da Florilandia perdiam-se de vista. Paradisíaco, o local cativava e transformava quem por ele passeava. Na balança, a certeza de que o magnetismo das rosas excede todo e qualquer espinho.

O recanto, considerado, à época, o único jardim brasileiro filiado a The Royal National Rose Society, de Londres, e a American Rose Society, despertava curiosidade. E, tão fascinante quanto a obra-prima, era seu idealista, que levava os visitantes a se perguntarem: quem é o homem por trás dos canteiros paradisíacos no Carangola?

Foto: Arquivo pessoal Maria Teresa Moreira de Souza

“Papai sempre foi um empreendedor e, ao mesmo tempo, um sonhador. Era um empresário bem sucedido. A maior rede dele foi a Ducal, que chegou a ter 140 lojas no país. Um dia ele resolveu largar tudo, morar em Petrópolis, onde tinha uma casa de campo, e criar rosas. Ele veio com esse sonho e fez da Florilandia conhecida internacionalmente”.

A fala é da corretora de imóveis Maria Teresa Moreira de Souza, de 59 anos. Teca, como é principalmente conhecida, é caçula do Doutor José Cândido Moreira de Souza, a “grande mente por trás do empreendimento”. Ela relembra os feitos daquele que dizia que “o bom da vida era ter os olhos nas estrelas e os pés na terra, entre suas rosas”.

“Todo mundo comprou a ideia do papai que, de repente, tinha esse outro lado muito romântico e, ao mesmo tempo, sonhador. Houve uma época em que existiam ônibus de turismo para a Florilandia. Aconteciam vários pedidos de casamento e bodas lá. Era muito emocionante porque no jardim havia música clássica rolando”.

‘Companheirinha’, como foi apelidada pelo pai, Teca descreve a estrutura do espaço que englobava uma casa de chá, a chamada ‘Casa Verde’; e a loja de plantas ‘Garden Center’. Isso sem falar nos cursos de jardinagem e decoração, promovidos com o apoio de sua mãe, a decoradora Maria Angélica, dona Geli.

Chegando a 12 mil roseiras, de 72 espécies, Petrópolis colecionava pedacinhos da Holanda, Inglaterra, França, Irlanda e Itália. Maria Teresa explica que, apesar disso, o pai deu início a um projeto de hibridização da própria rosa: “Acho que ele não foi até o final desse projeto, mas dizia que colocaria meu nome. Era uma rosa marrom, numa cor diferente, que não existia”.

Eterno espírito sonhador

Contrastante com a imagem que espera-se de um homem de negócios, José Cândido surpreendia por sua simplicidade. Radiante, via, nas rosas, detectores de emoções. Luiz Müller, de 59 anos, descreve a primeira vez em que o conheceu.

“Meu pai, que trabalhava para ele, ia lá para falar de negócios. Na primeira vez em que fui na Florilandia, observei meu pai conversar com um senhor de macacão jeans, com alicate na mão, que estava aparando as rosas. Me lembro de me perguntar: quando é que ele vai se reunir com o presidente do grupo? Até que me dei conta de que aquele senhor era o empresário José!”.

Aos olhos de Luiz, o espaço destacava-se pela música ambiente. “Era uma tecnologia moderna de um som-ambiente de alta qualidade que tocava música clássica. O José Cândido achava que as rosas gostavam, que elas cresciam melhor com ela”.

Mas não eram apenas as flores que desfrutavam das notas musicais. O cirurgião-dentista Orlando Gomez Martinez, de 56 anos, relembra as vezes em que se apresentou no local enquanto membro do Coral dos Canarinhos de Petrópolis, do qual participou dos 7 aos 18 anos de idade.

“Sempre que eu escuto ‘Florilandia’ eu me lembro, imediatamente, não das flores em si, mas das apresentações que aconteciam sempre aos sábados, por volta das 15 horas, em frente ao café colonial. Me lembro, principalmente, da alegria que a gente proporcionava. Quando as pessoas se aglomeravam, você sentia um ânimo brotando dentro de você”.

Luiz conta que o repertório costumava ser composto por músicas sacras, folclóricas e populares, como “Mulher Rendeira”,”Azulão”, “Ave Maria no Morro” e “Aquarela do Brasil”. No final do espetáculo regido pelos meninos, não faltavam aplausos e sorrisos nos rostos dos pequenos cantores.

“Os dias especiais pra mim eram, normalmente, aqueles em que havia uma menina bonita olhando. Acho que o contato com o público, naquele ambiente em especial, era muito diferente do que tínhamos na cidade. Era um conjunto da música, que te leva a outro patamar, com o espaço, extremamente favorável, e as pessoas numa vibração super para cima”.

Foto: Arquivo pessoal Maria Teresa Moreira de Souza

Propício para fotografias, o jardim era alvo de famílias que buscavam eternizar o momento nas alamedas. Para a aposentada Marcia Alecrim, de 62 anos, ir ao local simbolizava o programa de domingo ideal e o passeio obrigatório quando reuniam-se os primos e amigos de fora da cidade.

“Sempre que íamos lá, tínhamos filme na máquina. Minha avó influenciou muito esse nosso hábito. Ela sempre gostou muito de flores, mas como não podia andar muito, pedia para tirarmos as fotos e levar para ela. Na época morávamos no bairro e íamos caminhando até lá”.

De efeito quase que hipnotizador, a Florilandia, paraíso petropolitano, era objeto de contemplação: irradiava tranquilidade e transmitia a sabedoria daquele que, num mar de flores, redescobriu o sentido da vida.

(Matéria publicada no jornal Tribuna de Petrópolis em 25/11/2018)

*Créditos da foto de capa: Douglas Coulter

Carolina Freitas

Jornalista e escritora, Carolina Freitas se dedica ao resgate e à valorização da memória petropolitana a partir da produção de reportagens e curtas-metragens sobre a história, o comércio, e a vida da cidade.

5 Comments

  1. Boa noite, lembro muito dessa família! Meu Pai era jardineiro! Seu Nome Severino, minha mãe trabalhava como doméstica! Seu Nome María, eu tinha 8 anos meu irmão 9 morávamos numa casa que era dessa família! Lembro que ele, seu Zé Cândido ia aos Sábados e Domingo buscar meu irmão e eu para ir a quadra de tênis pegar bola para eles e seus visitantes! Além de pegarmos bolas de tênis abriamos a porteira para os visitantes! Ganhavamos muitas gorjetas! Lembro muito bem da Teteca! E Dona Geni, Bemoreira Ducal

    • Que bom saber que te trouxe boas lembranças, Sérgio! E muito obrigada por compartilhar um pedacinho do seu passado comigo!

  2. Boa noite, lembro muito dessa família! Meu Pai era jardineiro! Seu Nome Severino, minha mãe trabalhava como doméstica! Seu Nome María, eu tinha 8 anos meu irmão 9 morávamos numa casa que era dessa família! Lembro que ele, seu Zé Cândido ia aos Sábados e Domingo buscar meu irmão e eu para ir a quadra de tênis pegar bola para eles e seus visitantes! Além de pegarmos bolas de tênis abriamos a porteira para os visitantes! Ganhavamos muitas gorjetas! Lembro muito bem da Teteca! E Dona Geni, Bemoreira Ducal, hoje tenho 54 anos meus pais são vivos

  3. Há 50 anos estava no ultimo ano da faculdade de arquitetura e passava a nankin os desenhos de casas e reformas que dina Geli me passava. Ela era decoradora e sempre tinha trabalhos dela. Quem me apresentou foi o seu Sebastião um empreiteiro de obras magro alto e muito simpatico . Lembro da Teca o xodó do José Luiz era muito bagunceira. Me formei e mudei para a região dos Lagos e nunca mais fui em Carangola. Saudades !!!

  4. Cidade pequena essa… eu vivia pendurado no carnê da Ducal só para agradar as mocinhas.
    Também conhecia a Florilândia e jamais imaginei que o proprietário era o mesmo.
    Bons tempos da Cidade Imperial.

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