Equivalente, na denominação, ao espaço de cem anos, a extensão do local era, por outro lado, indefinida. Simbolizado pelo período de um século, o intervalo promovido pelo Café Centenário era paradoxo: compreendia o caminho mais curto rumo ao duradouro bem-estar proporcionado pelo bar.
De espaço ou de tempo, o intervalo do café era referenciado. Localizado logo abaixo do Bilhar Centenário, o ambiente compartilhava da mesma concentração dos jogadores do piso de cima que, numa só tacada, se empenhavam em encaçapar os entraves capazes de definir o sucesso do jogo.
Em partidas simples, ou em duplas, os jogadores adquiriam habilidade assistindo ou se unindo aos mais experientes – como fez o escritor José Roberto Whitaker Penteado, de 78 anos, até aprender a jogar com os craques.
“O único problema é que eles apostavam dinheiro e nós não tínhamos nenhum. No máximo quem perdia pagava o aluguel da mesa”.
Aplicadas à mesa, as regras da sobreloja também valiam porta afora. Até porque foi em parceria que os gêmeos portugueses José Joaquim Peixoto e Luiz da Silva Peixoto adquiriram e fizeram do café intervalo requisitado na rotina dos frequentadores e colaboradores.
Fora a semelhança genética dos dois, a dupla pensava parecido: combinava objetivos e estratégias, delimitava funções e obrigações. Assim, se pela manhã era o senhor Luiz quem abria o café, o responsável pelo turno da tarde era José, pai do engenheiro civil aposentado José Luiz Peixoto, de 66 anos.
Onde o verde do feltro dava lugar ao aval do semáforo, o Centenário aprovava o paradoxo feito pelo freguês; o de que o intervalo proporcionado pelo café equivalia não ao espaço de cem anos, mas ao atalho para o bem-estar indicado pelo bar, conhecido pela venda de lanches.
No lugar das bolas, ocupavam o triângulo da sinuca do café os elementos que definiam o curso do jogo: a máquina de sorvete – sucesso absoluto no verão; as balas – aliadas nas idas da garotada ao Cinema Capitólio; os caprichados sanduíches e também os salgados vindos da Padaria Guarani, na Sete de Abril.
Ponto intermediário entre o Capitólio, o antigo Fórum e o Jornal de Petrópolis, era ao Centenário que o público se dirigia depois de terminados, ou assim que iniciados, os trabalhos.
“Os vendedores de carro faziam ponto no bar do meu pai. Lembro deles usarem o telefone para fazer as vendas. Depois eles faziam um rateio e pagavam a conta”.
Ao final do placar do bar
Depois de terminado o expediente e, ainda que optado por direções diferentes, os trabalhadores das redondezas corriam o risco de, como na sinuca, cruzar e conciliar caminhos. E, quando isso acontecia, ah, aí era sinal de que o placar do bar estava próximo de acumular pontos.
Encaçapadas, as inquietações dos frequentadores do Centenário, ou melhor, a anulação delas, representava o bom desempenho do Café no jogo da vida. Para o bancário aposentado Milson de Castro, de 85 anos, entre um expediente e outro, passar por lá para comer um misto quente ou uma média com pão com manteiga era crucial.
Fundamental para ele e para os dirigentes, já que, quando por algum motivo ou outro ele não comparecia ao local, era logo intimado a retornar.
“Seu Peixoto era espetacular! Vinha no banco te procurar, dizer que tinha sentido sua falta no café. Era uma pessoa muito amável”.
Melhor na companhia do outro, o Centenário teve as parcerias da vez: os irmãos Peixoto na direção, a média acompanhada do pão na chapa e o Café como ambiente de trabalho do pai e tio da contabilista Marilena Pereira, de 58 anos. “Só meu pai trabalhou por uns dez anos como balconista, daí a família ia sempre lá tomar um pingado”.
Duradouro no nome e para além dele, foi o Café Centenário caminho mais curto rumo ao bem-estar proporcionado pelo bar.
(Matéria publicada no jornal Tribuna de Petrópolis em 22/12/2019)