No Setor das Embaixadas Sul, em Brasília, estão instaladas representações de 45 países. Trata-se, portanto, do mais expressivo endereço da diplomacia estrangeira no país. Mas, por pouco mais de meio século, este papel foi protagonizado por Petrópolis. De meados do século XIX até os anos 1920, era na cidade imperial que vivia o corpo diplomático. Inicialmente, as missões eram denominadas legações. Já no século XX, quando as relações do Brasil com um determinado país se intensificavam, uma legação poderia então ser elevada à condição de embaixada.
As primeiras legações, estabelecidas no Rio pouco após a Independência, começaram a se transferir para a cidade imperial na década de 1860. Petrópolis viria a se tornar “residência fixa do corpo diplomático acreditado junto ao governo” brasileiro, tal como informava o Almanak Laemmert: Administrativo, Mercantil e Industrial (publicação anual que, entre as décadas de 1840 e 1940 trazia informações sobre a administração pública, comércio e indústria, bem como sobre as missões estrangeiras).

Palacetes, casarões e hotéis do Centro histórico se transformaram em sede das legações e, muitas vezes, na residência de seus chefes (ministros), suas famílias e funcionários. As legações e, mais tarde, as embaixadas, frequentemente mudavam de endereço – mas quase sempre estavam situadas na praça da Liberdade e adjacências (tal como nas atuais ruas Monsenhor Bacelar, Barão do Amazonas, Nélson Sá Earp, Roberto Silveira, 7 de Abril, 13 de Maio, Imperatriz, Ipiranga e Avenida Koeler). Boa parte dos imóveis que foram sedes de missões diplomáticas já desapareceu. Mas outros ainda estão de pé, tais como os palácios da princesa Isabel, o palácio Grão Pará, o palácio Sérgio Fadel e alguns casarões do Centro histórico.

Andrés Lamas, ministro da legação do Uruguai, foi provavelmente o primeiro diplomata estrangeiro a viver em Petrópolis, em 1852. Ele morou em um casarão na rua Benjamin Constant, imóvel que hoje faz parte do conjunto arquitetônico da Universidade Católica. Não se tratava, porém, de uma missão diplomática, mas de uma propriedade particular. O primeiro registro de uma legação sediada em Petrópolis é de 1860. E ela era chefiada por ninguém menos que “o honrado William Dougal Christie, enviado extraordinário e ministro plenipotenciário” (isto é, com plenos poderes) do governo de sua majestade britânica, a rainha Vitória.

Em correspondência com um ministro brasileiro, Christie explicou que trocou o Rio pela cidade imperial por motivos de saúde. Ele permaneceu pouco menos de três anos em Petrópolis, até protagonizar, em 1863, a chamada “questão Christie”, que resultou no rompimento entre Brasil e Inglaterra e, portanto, na sua expulsão do país.
Mas o inglês lançou a “moda” e outras missões estrangeiras iriam subir a serra. Em 1862, chegaram os representantes de Estados Unidos e Rússia. Três anos depois, os enviados de Espanha, Portugal, Prússia (e, posteriormente, Alemanha). Na década de 1870, foi a vez de Áustria-Hungria, Bélgica, Países Baixos e Santa Sé (que, na década de 1920, viria a tornar-se o Estado do Vaticano). “Porque Petrópolis fosse a cidade dos diplomatas em caráter permanente, devido às endemias na capital, as audiências [com o imperador] no paço de Petrópolis [o atual Museu Imperial] tinham mais cerimônia que no Rio. O traje era casaca e as condecorações, sempre ostentadas”, escreveria Alcindo Sodré, idealizador e primeiro diretor do Museu Imperial, em 1940.

Publicações da época registram que, nos primeiros anos da república, também estariam em Petrópolis as legações de Argentina, Chile, Peru, Uruguai, França, Itália e Japão. Nos primeiros anos do século XX, a cidade também receberia representantes de Bolívia, Colômbia, Equador, Guatemala, México, Paraguai, Grécia, Pérsia (o atual Irã) e China. Motivo pelo qual mais de uma vez cronistas iriam referir-se a Petrópolis como a cidade dos diplomatas.

“Sociedade opulenta e dissipadora”
Como viviam os diplomatas estrangeiros em Petrópolis? Embora a estadia de um ministro ou embaixador geralmente durasse poucos anos, sua presença traria novos padrões para a alta sociedade da época. As legações mais importantes, ocupando palacetes em Petrópolis, expressavam a riqueza dos países representados, bem como as origens aristocráticas e o refinamento de seus ocupantes.
Uma curiosa reportagem sobre “A vida dos diplomatas em Petrópolis”, publicada na revista Kósmos em 1909, dá uma ideia de como vivia o corpo diplomático na cidade imperial. Tendo visitado algumas das missões e conhecido de perto alguns diplomatas, o autor da matéria, Elysio de Carvalho, elaborou uma pitoresca descrição do que denominou “o fausto desta sociedade opulenta e dissipadora”.
Além de exaltar ministros e embaixadores radicados em Petrópolis (todos eles “cavalheiros”, “gentlemens”, “eruditos”, “galantes”, “ilustrados” etc) e de suas (inevitavelmente) encantadoras mulheres, Elysio também descreve as sedes das representações que visitou. O trecho dedicado à legação do Chile, por exemplo, vem acompanhado por fotos da missão (naquele ano, um palacete na rua 13 de Maio, hoje desaparecido).

Segundo o autor, dentro do imóvel, denominado Villa Laurinda, “o mobiliário é composto de cadeira, poltronas e divãs antigos do estilo Luís XV, as tapeçarias são de Aubusson e do oriente, as porcelanas vieram de Saxe e de Sèvres, os cristais procedem da Bohemia”. Os ambientes eram igualmente enfeitados com raras e finas obras de arte, iluminadas por lustres florentinos.
Segundo Elysio, àquela época as missões mais “ricas” e luxuosas eram a legação da Alemanha e a embaixada dos Estados Unidos. Mas ele avaliou que nenhuma era tão bem decorada como a legação da Áustria-Hungria (então situada na rua 7 de Setembro, atual Imperatriz). No palacete, hoje desaparecido, havia “vastas salas forradas de colchas da Índia e de veludos de Arras”; “baixelas riquíssimas, esmaltes de Limoges”; “preciosos brocados”; “obras de arte primorosas”; “preciosas peças de mobiliário antigo”; “tapeçarias e faianças de valor inestimável”.

No cenário requintado, Elysio observou o “criado de libré [uniforme formal de criados de casas nobres e aristocráticas, com cores e insígnias da família a que serviam]” que abria “os reposteiros de damasco carmesim do grande salão” da legação. E descreveu a baronesa Riedl von Ridenau, mulher do ministro austríaco, como alguém à frente de seu tempo: ela praticava esgrima, era fotógrafa, dirigia “um auto”, jogava tênis e possuía “nada menos que cinco dúzias (de jogos de porcelana) de Sèvres”, da Bohemia, da Índia e do Japão. Aliás, quanto ao Japão, informou Elysio:
“Visitando a legação japonesa em Petrópolis, onde bebi o verdadeiro saquê, servido entre corteses reverências e quimonos bordados (…) tive sensações inexplicáveis. (…) Olhando para aqueles sabres (…), aquelas reluzentes armaduras, aqueles kakemonos [pintura ou caligrafia japonesa feita sobre papel de seda ou tecido], folheando estampas de Utamaro e de Hokusay [artistas do século XVIII], pensei muitas vezes estar na terra dos daimios e das gueixas”.
A descrição segue, bastante extensa, enumerando diversos outros objetos e obras de arte na legação, um palacete na Praça da Liberdade.
Embora não informe o endereço, Elysio localiza a legação do México “num recanto poético da serra e arranjada com gosto artístico esquisito [delicado]”, sendo “um sonho de sibaritismo [hedonismo] e de arte requintada”, “situada na encosta florida de uma colina, em estilo pompeano”. Na decoração, “cofres, cruzes com diamantes, vasos de Saxe, tapetes do Oriente, camafeus, gravuras (…) Impossível seria descrever, nesta breve resenha, as preciosidades artísticas” da legação, explica o autor.
Diplomatas e legações do Peru, Espanha, Argentina (então em um palacete na rua Doutor Sá Earp, ainda hoje existente) são citados em descrições equivalentes. Elysio encerra o texto citando a legação do Uruguai (à época, sediada na rua Barão do Amazonas), onde poucos dias antes havia acontecido um baile. Comentando o evento, que testemunhou, o autor de alguma forma traduzia o seu próprio deslumbramento, provavelmente extensivo aos brasileiros da high life: “Entre a onda multicor dos vestidos (…) o esplendor das joias e dos lustres, não se ouvia senão exclamações como estas: splendido, féerique, beautiful”.
Divertidas obrigações
O uso frequente de palavras estrangeiras, para além dos modismos de cada época, tinha ainda outra razão de ser: “Nas ruas [de Petrópolis], a todo momento, ouvem-se os idiomas (…) Por toda parte e constantemente o alemão, o inglês, o francês, o espanhol, o italiano, o árabe misturam-se ao português”, descreveu um cronista da Gazeta de Petrópolis, ainda na década de 1890. A presença de tantos estrangeiros fez com que a pequena cidade (com aproximadamente 20 mil habitantes à época), surgida à sombra da monarquia e do elitismo, ganhasse também ares cosmopolitas.

Os diplomatas contribuíam com este savoir vivre aristocrático ao promover eventos memoráveis: noblesse oblige, datas nacionais ou o aniversário de um chefe de Estado, por exemplo, eram sempre celebrados, com pompa e circunstância, nas legações ou em restaurantes finos. Tais eventos, que a imprensa frequentemente definia como “inesquecíveis”, sempre reuniam os representantes do corpo diplomático, do governo brasileiro ou da alta sociedade local.
Dos anos 1880 até os anos 1930, a imprensa iria noticiar, a cada semana ou quinzena, que ministros, embaixadores ou suas esposas estavam promovendo este ou aquele evento em Petrópolis. E a lista não era curta: houve banquetes, recepções, bailes, almoços, matinées, soirées, garden parties (festas nos jardins), five o’clock tea (o “chá das cinco”), chás dançantes, ceias, lunchs, piqueniques, concertos, cotillons (festas comemorativas), aniversários, fogos de artifício, excursões, exposições, quermesses, missas, passeios, visitas, sessões solenes, conferências e partidas de bridge ou tennis.

As comemorações também tomavam as ruas do centro quando navios de guerra estrangeiros aportavam no Rio: suas tripulações, por iniciativa dos diplomatas, eram levadas para estadias em Petrópolis. Em 1898, por exemplo, 80 marinheiros de dois cruzadores alemães, ancorados na capital, subiram a serra para festas na legação da Alemanha e em hotéis da cidade. No ano seguinte, foi a vez dos tripulantes de duas belonaves norte-americanas, recebidos com uma grande garden party na legação dos EUA. Uma testemunha deste evento publicou suas impressões na Gazeta de Petrópolis:
“Era um espetáculo digno de ver-se aquela multidão composta de cavalheiros corretamente trajados, de senhoras elegantíssimas. De quando em quando, criados corretos, atenciosos, atravessavam a multidão de convivas oferecendo licores, punch (ponche), sorvetes em profusão, havendo dois esplêndidos buffets perfeitamente servidos (…) Havia um redemoinho formado por sedas, plumas e rendas das primorosas toilettes femininas e pelas fardas dos oficiais”. No dia seguinte, os festejos prosseguiram em um grande baile na Pensão Central (um dos maiores hotéis de Petrópolis), reunindo “o que possuímos de mais distinto na política, nas ciências, no comércio e na indústria”.
Em 1898, tripulantes do cruzador português Adamastor subiram a serra e desfilaram em uma “carreata” com 40 veículos pelas ruas de Petrópolis – então especialmente enfeitadas com arcos de flores, bandeiras, e iluminadas com lanternas: “Sobre os carros que conduziam oficiais, as damas jogavam flores e confetti”, contou um repórter da Gazeta. O ponto alto foi uma garden party, com corrida de bicycletes, no Palácio de Cristal, especialmente enfeitado para a ocasião e, à noite, iluminado para um grande baile. Dois anos depois, a visita de oficiais da marinha chilena foi motivo para mais uma festa, atraindo uma multidão para a porta da legação, na praça da Liberdade. Em 1917, às vésperas do ingresso do Brasil na Primeira Guerra, a rua do Imperador também foi palco de um desfile com militares dos EUA, Inglaterra, Argentina e Uruguai.

O Rio Negro recebe os estrangeiros
Como sede de veraneio da Presidência da República, o Rio Negro também iria ser palco de eventos promovidos pelo governo brasileiro – com a devida participação dos diplomatas radicados em Petrópolis. Eventualmente, era neste palácio que um embaixador estrangeiro apresentaria suas credenciais ao presidente (e não no Catete, como de hábito). E era também no Rio Negro que presidentes ofereciam banquetes ao corpo diplomático, como foi o caso de Nilo Peçanha (1910) ou Epitácio Pessoa (1920).
Ao menos uma vez, o clima ameaçou uma festividade. Em 1899, ocorreu a primeira visita de um chefe de Estado ao Brasil – o presidente argentino Júlio Rocca. Recebido no Rio, ele também esteve na cidade imperial para um banquete e baile no Rio Negro que, pela primeira vez, seria iluminado por lâmpadas elétricas. Poucas horas antes do evento, porém, ocorreu um forte temporal de granizo. Embora tenha durado apenas 20 minutos, provocou incontáveis estragos em toda a cidade – especialmente em telhados, vidraças e, claro, nas lâmpadas espalhadas pelos jardins do palácio. Segundo a Gazeta de Petrópolis, caíram “pedras de até 1,2 kg”.

Ainda assim, segundo um cronista que participou do evento, o banquete foi um sucesso, seguido de um baile, que durou até as 3 horas da madrugada e que “foi a nota chic e elegante dos festejos, tendo comparecido a ele a flor da sociedade petropolitana”. Dois escudos representando as armas do Brasil e da Argentina, em cetim, foram instalados na entrada do palácio, que foi ornamentado com flores, folhas de palmeiras e bandeiras. O Rio Negro teve sua “luxuosa mobília (…) espalhada pelos salões para não atrapalhar as danças”. As lâmpadas dos salões não foram atingidas pelo temporal e iluminaram os “finos espelhos, com ricas molduras douradas”, bem como obras de arte. Em 1920 haveria outra visita – a do rei da Bélgica, Alberto I, que passou um mês no Brasil e, claro, em visita a Petrópolis também seria recebido com as devidas honras.

Petrópolis é uma festa
Mas não era necessário haver visitantes para movimentar a já intensa vida social dos diplomatas em Petrópolis. Nos primeiros anos do século XX, por exemplo, a legação da Áustria-Hungria oferecia recepções semanais. Na legação da Alemanha, segundo a imprensa, o ministro, conde de Arco Valley, frequentemente oferecia “festas esplêndidas (…) ao povo sem distinção de nacionalidades”, demonstrando “alta fidalguia” e “costumes puramente democráticos”. A representação alemã funcionava em um palacete (hoje desaparecido), na rua 13 de Maio.
Diplomatas norte-americanos, porém, eram os mais “festeiros”. Na virada do século, o chefe da legação, coronel Page, ganhou fama porque frequentemente “abria seus salões à elite petropolitana, onde se pode ouvir boa música” – e o 4 de Julho, data nacional dos EUA, era sempre motivo para memoráveis banquetes e garden parties na sede da missão, que em 1905 seria transformada em embaixada.
O mais “famoso” dos diplomatas daquele período, porém, foi outro americano, Edwin Morgan, celebrizado como o grande “animador” da vida social em Petrópolis, que assumiu como embaixador em 1912. Morgan tornou-se extremamente popular na cidade imperial, onde viveu por duas décadas, tendo morado em diferentes endereços, como na rua Ipiranga, na Villa Itararé (praça da Liberdade) e no palácio Grão Pará. Sua simpatia pela cidade era tão grande que, às vésperas da aposentadoria, em 1933, manifestou o desejo de passar sua velhice em Petrópolis, onde queria ser sepultado – o que efetivamente aconteceu, no ano seguinte.
Devido à Primeira Guerra, as legações de países envolvidos no conflito (Inglaterra, França, Portugal, Itália, Rússia, Japão, Bélgica, Alemanha e Áustria-Hungria) suspenderiam suas atividades festivas. Mas os EUA, inicialmente, não participavam da guerra – e Morgan prosseguiu com suas comemorações “inesquecíveis”. Em 1916, por exemplo, ele promoveu um baile de carnaval à fantasia, na embaixada americana (então situada na rua Ipiranga), tendo ele próprio se fantasiado de mandarim.
Em 1917, os EUA ingressaram na guerra, mas já no ano seguinte veio o armistício. Morgan iria promover outro baile, no Palácio de Cristal, marcando o carnaval petropolitano de 1920. Três anos depois, comandou mais um baile carnavalesco, agora no Tennis Club (onde hoje está o clube Petropolitano, na avenida Roberto Silveira). Desta vez, o embaixador posou para fotografias fantasiado de Pierrot.

Não era raro que as festas tivessem como objetivo reunir fundos para a caridade ou para obras públicas. Entre 1924 e 1926, o embaixador da França, Alexandre Conty, promoveu “festas da arte”, em benefício do Asilo dos Desvalidos, do hospital Santa Teresa e das obras da catedral. Estas festas aconteceram no Theatro Petrópolis (em um imóvel, hoje desaparecido, na rua do Imperador, endereço vizinho à galeria Marchese). Em eventos desta natureza, havia números musicais e peças teatrais, nas quais os “artistas” eram diplomatas, funcionários da própria missão e figuras da alta sociedade. Até mesmo Conty participou, como “ator”.
Ainda em 1924, o então presidente Arthur Bernardes recebeu as credenciais do embaixador da Itália, Giuriati, no palácio Rio Negro – evento que precedeu outra comemoração, na embaixada italiana, então situada na rua Benjamin Constant. Giuriati vinha substituir o marechal Badoglio (que 20 anos depois, com a queda de Mussolini, iria assumir o governo da Itália, tendo negociado o armistício na Segunda Guerra Mundial).
Em 1929, os italianos iriam promover uma festa à fantasia em sua embaixada, também em benefício das obras da catedral. E, ainda naquele ano, houve no mesmo local uma recepção à qual “compareceram os membros mais ilustres da colônia italiana de Petrópolis e do Rio”, bem como “representantes do fascio”, segundo a imprensa da época. Uma imagem do evento mostra um aspecto singular: dezenas de homens, reunidos para a foto, quase todos usando camisas pretas – o “uniforme” fascista.

Momentos graves
Em 1903, ocorreu uma das mais celebradas conquistas da diplomacia brasileira: o tratado de Petrópolis, que assegurou a incorporação do Acre ao Brasil, superando uma grave crise com a Bolívia, a partir de negociações conduzidas pelo barão do Rio Branco. O documento foi elaborado e assinado na casa de veraneio do próprio barão (na Westfália, na avenida batizada em sua homenagem), local em que ocorreram as negociações com os representantes bolivianos.


Outras circunstâncias, porém, não foram tão felizes. Além do rompimento com a Inglaterra, em 1860, o Brasil também iria romper relações com Portugal, em 1894. O ministro português, conde de Paraty, foi declarado persona non grata (expressão latina que designa um diplomata como indesejável) e teve de abandonar às pressas a legação em Petrópolis (na rua Visconde de Souza Franco). A crise entre os dois países ganhou força após trechos da correspondência entre Paraty e seu governo terem sido publicados na imprensa carioca. O vazamento deveu-se a um ato de “espionagem”: segundo a Gazeta: um agente do governo de Floriano Peixoto “veio propositalmente a Petrópolis para acompanhar o conde em todos os seus passos, e telegrafar para o Rio, adulterando todas as suas ações”.

O rompimento diplomático com Portugal ocorreu em um momento difícil para as missões estrangeiras no Brasil, alvo frequente de gafes e descortesias do então presidente Floriano Peixoto: “Dificilmente terá havido governo com tão escasso e difícil relacionamento com o corpo diplomático estrangeiro quanto o de Floriano. Para agravar a situação, todos os chefes de missão residiam em Petrópolis, distanciados, portanto, da capital”, conta o diplomata Sérgio Corrêa da Costa. Como exemplo deste contexto, ele cita um “protesto” dos enviados estrangeiros: “No dia 15 [de novembro de 1892], terceiro aniversário da Proclamação da República, nenhum dos diplomatas desceu de Petrópolis para apresentar cumprimentos às autoridades”.
Outro rompimento diplomático iria ocorrer em 1917, devido ao afundamento de navios brasileiros, torpedeados por submarinos alemães (evento descrito em outra reportagem do Petrópolis sob Lentes, que pode ser acessada aqui). O Brasil, embora inicialmente neutro na Primeira Guerra, já há algum tempo parecia pender para os Aliados – haja visto o banquete que Lauro Muller, ministro do Exterior, ofereceu ao ministro inglês, Arthur Peel, no Rio Negro, no ano anterior. As preferências políticas da high society de Petrópolis ficaram evidentes em março de 1917, quando, em um evento em favor da Cruz Vermelha, Ruy Barbosa pronunciou uma célebre palestra sugerindo o alinhamento do Brasil aos Aliados, no Theatro Petrópolis.
A agenda dos diplomatas em Petrópolis também iria incluir momentos fúnebres. Em 1900, a legação italiana reuniu todo o corpo diplomático na igreja do Sagrado Coração, para uma missa pela morte do rei Umberto I, então recentemente assassinado. Além disso, outras solenidades homenagearam diplomatas que morreram em Petrópolis, no exercício da função. Foi o caso de Fukashi Sugimura, ministro japonês, em 1909; e de Pedro Maximow, ministro da Rússia, acometido por mal súbito na legação, que ficava na rua Silva Jardim, em 1915. Mas foi a morte do já citado conde de Arco Valley, em 1909, que mais comoção provocou na cidade, devido a sua popularidade.
Após o fim da primeira guerra mundial (1918), as relações diplomáticas do Brasil assumiram novos patamares. Paulatinamente, todas as legações seriam transformadas em embaixadas e instaladas (como é da tradição) na capital do país. Algumas missões (como as de Inglaterra ou Estados Unidos) mantiveram imóveis em Petrópolis. E alguns diplomatas continuaram morando na cidade. Eventualmente, outras representações até iriam funcionar provisoriamente na serra, nos meses de verão. Porém, ao fim da década de 1920, todas as missões estrangeiras estariam sediadas no Rio.
Nos anos 1930 e 40, embora ainda fosse o destino de veraneio da elite, Petrópolis não era mais a “cidade dos diplomatas”. O Quitandinha ainda iria receber, em 1947, a Conferência Interamericana, que por duas semanas reuniu chefes de estado e outros representantes de países do continente. Mas os tempos já eram outros: a opulência das missões, a sofisticação dos enviados estrangeiros, bem como as festas e outros eventos “inesquecíveis”, nos palacetes e ruas de Petrópolis, tornaram-se apenas histórias. Hoje já bastante esquecidas.