Na veia da família Eckhartt, um gosto pelo comércio que incendeia. A base do regador, o trabalho fazia acordar um amor. Quieto, mas indiscreto, transbordava e acalentava a alma. De utensílios domésticos a ferragens, a Casa Roberto providenciava as maçanetas responsáveis por abrir e manter portas abertas.
E foi a preocupação em providenciar um atendimento pautado pela atenção que fez com que a casa fosse requisitada e tida como referência na cidade. O professor de história aposentado Sérgio Peterssen Mynssen, de 70 anos, relembra a campainha tocada pelo “seu” Roberto quando eram identificados fregueses sem serem atendidos.
“Petrópolis inteira era cliente da Casa Roberto. Ele trabalhava lá dentro, sentado numa mesinha que tinha uma campainha. Quando o cliente entrava e não era atendido ele a tocava. Era uma casa de ferragens, com tudo que você pudesse imaginar desse ramo. Muitos funcionários de lá, no final de suas vidas, saíram e abriram as próprias lojas”.
Descrito por Sérgio como uma figura lendária, o senhor Roberto emanava respeito. O advogado Artur Lima, de 47 anos, recorda a passagem do pai enquanto funcionário da casa e, principalmente, o profissionalismo daquele que deu nome a uma das lojas mais prestigiadas em Petrópolis.
“Meu pai trabalhou lá por 20 anos. Cheguei a conhecer o senhor Roberto e tudo. Uma pessoa muito solícita e ética no atendimento. Era uma loja grande e o senhor Roberto atendia a gente muito bem, assim como aos funcionários. Mesmo bem pequeno me lembro dele como uma pessoa muito generosa”.
Numa disputa acirrada pelo fator que mais garantia a presença da clientela estão, empatados, o atendimento cortês e a organização minuciosa da casa. Para o ex-frequentador Marco Guedes, observar a disposição das mercadorias, por si só, já era motivo suficiente para querer ir até a Casa Roberto.
“Era uma loja maravilhosa! Super organizada. Uma loja de ferragens ao bom estilo das lojas de ferragens das cidades pequenas do interior dos Estados Unidos. Tudo super organizado com prateleiras e gavetas com suas amostras para o lado de fora. Dava gosto de ir lá só para ficar admirando os materiais e as ferramentas”.
Variedade e versatilidade
Diversificadas, as mercadorias comercializadas pela Casa Roberto tinham mil e uma utilidades. Prova disso foi a serventia dada pelo aposentado Wilson Silva Junior, de 69 anos, à cera de carnaúba. Tida como uma descoberta preciosa, foi ela a responsável por fazer fluir os campeonatos de botão da molecada.
“Descobrimos lá na Casa Roberto essa cera que fazia os botões deslizarem mais. Comprei muito dela para encerar meus times de botão. Éramos da turma da Nilo Peçanha e, nessa época, devíamos ter uns 12 ou 13 anos. Inclusive, nosso campinho dava para os fundos da loja. Às vezes nossa bola caía lá e quem quebrava nosso galho era o funcionário Lambreta”.
Assim como para a clientela as idas ao estabelecimento se tornaram memoráveis, para os balconistas, como é o caso da ex-funcionária Lídia Maria Fragoso Farias, de 51 anos, foram dias de muito aprendizado. Tendo trabalhado na casa por 6 anos, desde que tinha 16, Lídia evoca algumas das muitas memórias e histórias vividas lá dentro.
“Fui madrinha de casamento de um colega de trabalho e cheguei a ir ao Holiday On Ice com outras colegas de lá. Carrego comigo o respeito, a amizade e os conselhos. Nunca me esqueci de quando o seu Roberto me ensinou a montar as luminárias fluorescentes. Eu não sabia se segurava a furadeira ou se tremia”,.
Estimulados a manter a postura ereta durante o atendimento ao cliente, alguns dos princípios que regiam a loja eram quase que intrínsecos aos descendentes de alemães. A petropolitana Elisabeth Pfeiffer Pedreira Ferreira, de 68 anos, sobrinha de Roberto, destaca o comprometimento da família que dedicou a vida ao comércio.
“Minha avó era irmã do tio Roberto. Era ele na Casa Roberto e meu pai, Elmo Geraldo, e meus tios, Jorge Paulo, Maria Amélia e Olga Raquel, a frente da loja Ao Regador (ferragens) e, mais tarde, da Loja Nova (utensílios domésticos). Eram muito trabalhadores, quase que como cavalos que não olham para os lados, só andam para frente”.
Com propostas e dinâmicas bem semelhantes, a concorrência se dava entre a própria família. Como explica Elizabeth, a Casa Roberto tinha uma vantagem: o tamanho. Ampla, permitiu a abertura de duas alas, uma dedicada às ferragens e a outra aos utensílios domésticos – panelas, louças, travessas em inox e produtos em prata.
“Eles mexiam com as mesmas mercadorias, eram família, mas os negócios eram distintos. Às vezes quando entrava alguém na Casa Roberto em busca de algum produto que meu tio não tinha ele virava para a pessoa e dizia assim: aguarda um momentinho que eu vou lá no depósito buscar e, na verdade, ele ia na loja do meu pai, que ficava furioso”, diz rindo.
Firmes, honestos e trabalhadores, os comerciantes das famílias Eckhartt e Pfeiffer faziam da troca com o cliente uma relação resiliente, marcada por portas abertas e descobertas.
(Matéria publicada no jornal Tribuna de Petrópolis em 21/04/2019)
[…] teve início com uma ‘portinha’ na Rua Washington Luiz. Ambos ex-funcionários da Casa Roberto, pode-se dizer que foi na referida loja que a dupla estabeleceu seu marco […]